E O GALO CANTOU...
Pe. Rafhael Silva Maciel
Inspirado
na homilia de Dom José Antonio, hoje, 26.03.13, no Seminário Propedêutico,
pus-me a refletir no seguinte:
Na cena evangélica da negação
de Pedro (Jo 13,38// Lc 22,34.60), surge nela, não como um componente
cenográfico, mas como parte essencial da narrativa o famoso GALO. É isso mesmo! Um galo, que pode parecer
à primeira vista algo supérfluo ou apenas para dar um tom sombrio à cena da
negação/traição; mas a presença desse animal aí na cena é importantíssima.
Para aqueles que conhecem,
vivem ou viveram no campo, no meio rural, é comum de madrugada, bem nos
primeiros indícios dos primeiros raios do sol, ouvir o canto do galo; isso
inclusive gerou um dito popular sobre as pessoas que acordam cedo, ao se dizer “(fulano) acordou com as galinhas”, ou
seja, acordou cedinho, com o canto do galo, que canta para despertar o
galinheiro. Acontece que o galo canta e acorda não só seu galinheiro, acaba por
acordar muitas pessoas que se dão conta que já é hora de despertar!
Para o povo da Bíblia o canto
do galo é uma metáfora (incômoda) para falar do despertar das consciências.
Parabolicamente o canto do galo que desperta pessoas de uma noite de torpor e
de sono, fazendo-lhes abrir os olhos e acordar para a realidade circundante é o
mesmo que o canto da consciência (aqui o galo), que faz as pessoas saírem de
situações de torpor e “inconsciência” para pisarem a realidade concreta dos
fatos e das suas atitudes.
Pedro, ao ouvir o canto do
galo, no Evangelho da negação, não escuta somente o galo que canta de
madrugada, fim de noite (Jo 13,30b); Pedro depara com olhar de Jesus em sua
direção (Lc 22,61), e esse olhar de Jesus é como o canto do galo que desperta
seu coração e sua mente para perceber o quê tinha feito (Lc 22,61b). Pedro toma
consciência do torpor, do medo e da incoerência para com suas próprias
palavras, ditas a Jesus, de que morreria pelo Mestre (Jo 13,37// Lc 22, 33).
Pedro está, aqui assustado e inquieto, diante de tudo o que presencia. Pedro fica
perturbado, comovido, entende o que acabou de fazer, negando ao Mestre; sabe
que pecou gravemente. O olhar de Jesus (“o canto do galo”) leva Pedro ao choro
de um arrependimento tomado de uma contrição verdadeira, movido pela graça de
Deus.
Parece que nos dias de hoje
precisamos ouvir “muito galo cantar”, para acordarmos do sono e da inércia em
que vivemos, diante da realidade e daquilo que o Senhor tem pedido a cada um.
Quantas vezes temos dormido, cochilado, entrado em estado de letargia, diante
do pecado, diante das omissões para com os irmãos; quantas vezes nossa
mentalidade está tomada pelo medo das consequências do seguimento de Cristo.
Com toda certeza, se ouvíssemos mais o galo cantar (a consciência de nossas
ações diante da Palavra) não negaríamos tanto ao Senhor quando não o amamos
concretamente nos irmãos; não entraríamos em roda de fogueira (Lc 22, 55) para
nos aquecermos junto aos acusadores de Jesus; não adentraríamos em ambientes
(físicos ou mesmo intelectuais) onde se recusa ao Amor.
No mundo de hoje, imbuídos pelo
que o Ano da Fé convida tem nos convidado a viver na proclamação da nossa Fé em
Jesus Cristo, como povo de Deus, Corpo de Cristo, estamos convidados a “continuar amando o Senhor; mas isto não
basta: tem obrigação, apesar do risco evidente, de não dissimular a sua
condição de discípulo” (Bíblia de Navarra, comentário página aos versículos
55-62, p. 1028). Urge, portanto, ter claro que o desânimo de, por vezes
tomarmos consciência de nossas incoerências, não deve nos afastar do Senhor, é
assim que escutamos as palavras do Papa Francisco: “nunca sejais homens, mulheres tristes: um cristão não o pode ser
jamais!” (Homilia do Domingo de Ramos, 24.03.13).
Ouçamos o canto do galo,
pelo anúncio da Palavra de Jesus, que liberta e salva; ouçamos o canto do galo,
do despertar da consciência que nos faz encarar o olhar de Jesus que nos chama
à conversão. Olhar de Jesus que ao encontrar o olhar de Pedro amou-o, sem
recriminar, num gesto “silencioso e cheio
de ternura”, mas que é eloquente. Deixemo-nos invadir pelo olhar
misericordioso de Jesus e sendo amados por ele amemos por ele a todas as
pessoas. Amém.
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